Artigos Serginho Valle


A homilia

A homilia, etimologicamente, significa "conversa familiar". Hoje, esse conceito pode parecer idealizado, já que o contexto em que a homilia acontece não favorece uma conversa verdadeiramente familiar. Durante a celebração, a comunicação é unidirecional: o padre fala e a assembleia escuta. No entanto, o sentido de "conversa familiar" pode ser mantido na forma de se expressar, com uma mensagem acessível e facilmente acolhedora, como acontece em verdadeira “conversa familiar”.

O que a homilia, não é? 

  1. Não é um sermão: A homilia não segue o estilo do sermão, caracterizado pelo tempo longo, carregado de retórica e com um forte acento moralista e moralizante.
  1. Não é uma pregação extensa: A homilia não tem duração longa, que é característica do estilo das pregações, que podem durar 1 ou mais horas.
  1. Não é uma aula de exegese: A homilia não consiste em realizar uma explicação detalhada das leituras, do ponto de vista de pesquisas e teses exegéticas, embora, às vezes, seja útil contextualizar um texto bíblico em vista da compreensão.
  1. Não é uma palestra motivacional: A homilia não tem nada e nem se parece com discursos ou palestras motivacionais, em estilo coach, oferecendo "pílulas" de motivação e incentivos de otimismo.

Qual o objetivo principal da homilia?
A homilia tem como principal característica a atualização da Palavra de Deus para o contexto histórico atual. A Teologia Litúrgica traduz o movimento e a dinâmica da “atualização” com o termo “memorial”. Neste caso, a homilia é conduzida pela ação do Espírito Santo, atuando por meio do homiliasta para que a Palavra seja vivenciada por cada celebrante e em toda a comunidade. A homilia, em uma primeira compreensão, é um momento de partilha em que o homiliasta transmite (partilha) a sua experiência pessoal e existencial da Palavra de Deus, aplicando-a à realidade dos celebrantes. O homiliasta, portanto, não fala de um tema da Bíblia, mas da sua experiência iluminada pela Bíblia, pela Palavra. É isso que o caracteriza como profeta.

Como a homilia se diferencia de uma aula?
O que foi proposto faz compreender que a homilia não é uma aula. Enquanto a aula tem um caráter explicativo e intelectual, a homilia se caracteriza como partilha existencial. O homiliasta não está apenas explicando o Evangelho e as leituras, mas sim transmitindo a vivência espiritual e convidando os celebrantes a iluminar suas vidas a partir da Palavra. Cada homilia, portanto, não explica as leituras, mas acende luzes de como viver a Palavra.

A responsabilidade do homiliasta
O homiliasta, ao proferir a homilia, assume uma grande responsabilidade diante de Deus e da assembleia. Ele se responsabiliza não apenas em conhecer a Palavra de Deus — estudando, preparando a homilia, rezando a Palavra —, mas vivenciado a Palavra que irá refletir com a assembleia. Como Jesus ensina: “a boca fala daquilo de que o coração está cheio” (Mt 12,34). Assim, o homiliasta precisa ter a Palavra no coração, ter o coração cheio da Palavra de Deus, para que a sua fala vá além da retórica e seja autêntica e inspiradora.

Objetivos da homilia
Dentre vários objetivos da homilia, como consequência desta minha reflexão, destaco apenas dois objetivos da homilia, especialmente da homilia dominical: crescimento espiritual e crescimento na caridade. O processo é de crescimento, não de informações sobre a Bíblia, sobre o Evangelho.

  • Crescimento espiritual: A homilia tem como um de seus objetivos principais fomentar o crescimento espiritual dos celebrantes. É um modo de a Igreja fomentar a espiritualidade e alimentar espiritualmente os celebrantes através de celebrações evangelizadas e evangelizadoras.
  • Crescimento na caridade: A partir da vida espiritual, a homilia também deve inspirar os celebrantes a viverem a caridade no seu dia a dia. Tendo proposta vivencial, o resultado da homilia é prático e, no caso, a prática de relacionamentos fraternos e fraternizados na sociedade. 

Sobre a incisão no modo de se relacionar socialmente como cristão, o Documento da CNBB de 2012, nº 88, reforça isso ao dizer que a Palavra de Deus "nos impele para os irmãos", sendo ela a luz que purifica, converte e propõe aos celebrantes estarem a serviço da fraternidade. A homilia é, portanto, um instrumento fortalecedor da vida cristã e das relações fraternas em toda a sociedade.

Considerações finais
O bom homiliasta conhece a Palavra de Deus tanto pela ciência (estudo) quanto pela experiência de vida. Por isso, deveria assumir o compromisso de nunca deixar de estudar a Palavra (fazer exegese) e, mais ainda, viver a Palavra, de modo que, ao falar, sua homilia seja um reflexo do que vive. Como foi dito, o homiliasta testemunha, com seu estilo de vida o que diz em sua homilia. A verdadeira força da homilia, pensando bem, não está na eloquência, mas na autoridade espiritual do que é partilhado e vivenciado pelo homiliasta.

Serginho Valle 
Setembro 2024