Pedagogia de setembro de 2022
Nas propostas celebrativas dos Domingos de
setembro 2022, sugerimos acolher a proposta pastoral da CNBB para o mês da
Bíblia. É um modo de celebrar a Liturgia na paróquia sintonizando-se com a
proposta pastoral do Mês da Bíblia.
Neste ano, as reflexões do Mês da Bíblia
inspiram-se no Livro de Josué, com o lema: “O Senhor, teu Deus, estará
contigo por onde quer que vás” (Js 1,9). A escolha do Livro de Josué,
segundo os organizadores, inspira a comemoração dos 200 anos da
"Independência do Brasil". Josué, líder religioso e líder político,
ao buscar a sabedoria da Palavra de Deus para conduzir o povo à Terra
Prometida, inspira as lideranças religiosas, políticas e sociais de nosso
tempo, a buscar a sabedoria da Palavra de Deus para conduzir o povo nos caminhos
da partilha fraterna e da justiça social, propostos na Palavra das celebrações
de setembro.
Josué foi uma grande liderança no caminho para a
posse da terra prometida. Nos momentos de dificuldades, de desânimo, era a fé
religiosa do povo, iluminada pela Palavra, que acendia ou renovava o ardor do
povo. O exemplo de Josué inspira nossas comunidades eclesiais a serem voz que
anima a fé e a esperança do povo a não perder o passo e a alegria de caminhar
rumo à terra prometida de tempos de mais fraternidade e paz social. Em tal
conjuntura, a Palavra de Deus lança um olhar crítico, no decorrer de todas as
celebrações de setembro 2022, sobre a administração do bem público.
Administrar
o bem público
Administrar é a palavra chave para compreender a
pedagogia litúrgica deste mês de setembro 2022, inspirando-nos no tema proposto
pelo Mês da Bíblia. Entre os sinônimos e significados do verbo “administrar”
encontra-se o verbo “governar”. O governo de um povo é um administrador
dos bens do povo: a vida do povo, em primeiríssimo lugar, a sua saúde, os bens
do povo, a segurança...
Devido a proximidade das eleições, a proposta da
pedagogia litúrgica poderá ser confundida com campanha política. É um risco.
Mas não é a intenção, uma vez que a Palavra das celebrações do Mês da Bíblia
coincide em lançar um olhar profético para a realidade social e política do
nosso país, que completa 200 anos de independência. A figura crítica do Profeta
Amós favorece a aproximação da Palavra de Deus à nossa realidade social.
Administrar com sabedoria
A primeira proposta pedagógica convida os
celebrantes a considerar a administração da sociedade a partir dos ensinamentos
do Evangelho (23DTC-C). Isto acontece quando se conhece os pensamentos de Deus
para o povo (1L do 23TC-C), o que significa olhar para a sociedade com a luz da
sabedoria divina, intercedida pelo salmista: ensinai-nos a contar os nossos
dias e dai ao nosso coração sabedoria” (SR do 23DTC-C).
A sabedoria divina coloca duas exigências; ambas
servem para a vida pessoal e para quem é escolhido para governar o povo: tomar
a cruz e administrar. A expressão “tomar a cruz” no seguimento de Jesus não se
configura a entrar num caminho de sofrimentos, mas de doação da vida. A
sabedoria divina se faz presente quem vive na oblação plena da vida a ponto de
desapegar-se de tudo, até dos seus interesses para viver como Jesus, fazendo a
vontade do Pai.
A sabedoria divina ensina administrar, governar a
vida pessoal e o povo, sem aventuras. Jesus diz que antes de assumir um
empreendimento, seja aquele de se colocar na estrada do discipulado como aquele
de governar um povo (dentro do nosso contexto), exige a prudência de sentar-se
e avaliar como agir: calcular os gastos para construir uma torre, avaliar as
possibilidades de vitória antes da guerra. A administração da vida pessoal e da
vida do povo, dirá a Palavra do 23DTC-C, não é aventureira, é calculada com a
sabedoria e com a prudência de quem valoriza a vida pessoal e a vida do povo.
Administrar com a reta intenção para o bem
Um segundo elemento da administração, presente
nas celebrações de setembro 2022, está sendo sugerido nas propostas do SAL –
Serviço de Animação Litúrgica – do ponto de vista social. Chama atenção para o
distanciamento de Deus da parte do povo. A 1ª leitura do 24DTC-C coloca a causa
na idolatria, na fabricação de ídolos. É o “bezerro de ouro” que pode
ser a idolatria do dinheiro, a idolatria de ideologias partidárias, a idolatria
do poder, idolatria das riquezas... como todo ídolo, é sempre uma construção
humana, uma proposta ideológica humana.
O filho pródigo, no Evangelho do 24DTC-C, é
exemplo de quem se distancia de Deus para buscar o ídolo do prazer, da vida
transformada em festanças. Quem obedece à voz da idolatria, se não mudar de
rota, vai terminar num chiqueiro, comendo porcaria (E do 24DTC-C). Isto pode
acontecer individualmente, mas pode ser o destino de um povo que segue
ideologias idolátricas de algum mito. Hitler é o exemplo maior desse fato.
Administrar com honestidade
A profecia para uma sociedade que alimenta como
único objetivo do povo o crescimento econômico aparece no 25DTC-C. É quando
entra em cena o Profeta Amós com as conhecidas denúncias que faz contra reis,
governos e ministros que cultivam a “idolatria do mercado” em detrimento
do povo. Nas assembleias celebrativas de nossas paróquias, a profecia de Amós
denunciará a “idolatria do mercado” provocadora da pobreza e da fome num
país que é um dos maiores produtores de alimentos do mundo.
Na “idolatria do mercado” aparece a figura
do “servo infiel”, relatada por Jesus no Evangelho do 25DTC-C. Muitos
estudiosos da Bíblia dizem que, muito possivelmente, não se trata de uma
parábola, mas de um comentário feito por Jesus ao saber que um servo de uma
estatal ou de um banco público foi desonesto e se serviu da corrupção para
enriquecer. Aquele administrador é o retrato de administradores (governos)
desonestos, que privilegiam o individualismo, maltrata, oprime e domina o pobre
(1L do 25DTC-C). Vale, portanto, a orientação de São Paulo para rezar pela
honestidade dos governantes a fim de se ter uma vida social serena (2L do
25DTC-C).
O outro lado da desonestidade encontra-se no
exemplo divino, dedicando-se para levantar da poeira o indigente e para retirar
do lixo o pobrezinho que passa fome (SR do 25DTC-C). A colocação dos dois
quadros, daquele do administrador desonesto e da administração divina, cantada
pelo salmista, ilustram dois modelos de administração.
Administrar com solidariedade
Por fim, no último Domingo de setembro, o
26DTC-C, no qual se celebra o “Dia da Bíblia”, a Liturgia volta a ser
profética contra os cultivadores da “idolatria do mercado” classificando
os pobres como seres de segunda categoria por não terem “poder de compra”. Como
em toda idolatria, o resultado dessa ideologia que toma conta de políticas
públicas, é injusta e cruel por condenar os mais pobres a morrer de fome. Esta
é a profecia de Amós (1L do 26DTC-C): ai daqueles que vivem nos castelos de
alvoradas e deixam o povo morrer de fome por não adotar uma administração que
solidariamente partilhe alimento para todos.
O destino de uma
administração voltada para o banquetear-se dos ricos (E do 25DTC-C) é a morte e
a condenação da idolatria da riqueza. O tema de Lázaro ao lado de Abraão, não
deve transformar a parábola de Jesus em “ópio social”, em uma anestesia para
dizer: fiquem pacientes e tranquilos porque na outra vida acontecerá o oposto.
A mensagem da parábola não é anestésica e nem é para o outro mundo. É uma
parábola que fala para o nosso “agora”: a fome do pobre é real e o
administrador (governador) que tendo riqueza rico e não partilha seus bens está
em pecado de egoísmo. É um quadro que convida a administrar a sociedade com
solidariedade e não com interesses que agridem a vida do povo, especialmente a
vida dos mais pobres.